Ao ler uma matéria do Último Segundo denominada "Rivotril: a tarja preta mais vendida no Brasil", deparei-me com o seguinte comentário de um anônimo:
A forma mais perniciosa de manifestação religiosa é justamente o fanatismo. Atuando como uma verdadeira lavagem cerebral sobre os fiéis, o fanatismo negligencia qualquer atitude racional, criando um mundo apartado da realidade e sendo esta uma das características técnicas do conceito de loucura (viver dentro de um contexto completamente separado do meio exterior). A partir daí, qualquer atitude, por mais incoerente que ela possa ser, torna-se justificável sob a alegação de que trata-se de uma "legítima defesa do que é divino". E quando a fé sobrepõem-se ao bom senso, os resultados são sempre muito desastrosos. Como fenômeno humano, o fanatismo faz parte da própria história mas causa muita indignação por ainda permanecer extremamente forte nos tempos modernos, período este em que o avanço geral da sociedade deveria dar pleno suporte para eliminar comportamentos tão primitivos. O fundamentalismo Islâmico contemporâneo, por exemplo, constitui apenas a repetição dos atos insanos cometidos pelo Cristianismo durante a Idade Média. A mesma dinâmica permanece acesa nas contínuas escaramuças entre hindús e muçulmanos pela disputa do território da Caxemira na Índia, bem como na sangrenta e intolerante discórdia entre árabes e judeus no Oriente Médio e a variável resultante envolvendo o terrorismo internacional. A única novidade é que agora os acontecimentos dessa natureza possuem uma alcance muito maior, sendo uma ameaça globalizada que atormenta direta ou indiretamente todas as pessoas em qualquer parte do mundo. E por mais que haja motivações políticas, sociais e econômicas envolvidas no radicalismo muçulmano (de fato, tais motivações existem e são legítimas) o ato derradeiro de acabar com a própria vida e com a vida de terceiros em nome de uma crença é fundamentalmente religioso. A promessa de reconhecimento divino e a posterior recompensa influenciam progressivamente o indivíduo ao ponto dele poder estar disposto a cometer o ato decisivo: o suicídio. Pior ainda é quando tal ato envolve a vida de terceiros, sendo ainda mais carregado de fanatismo e tanto mais forte o sentimento de religiosidade presente na atitude assassina. O menosprezo pelos outros pontos de vista é tamanho que o universal direito à vida é quebrado em nome da insana crença de que a convicção religiosa está acima da vida humana. O fato de sermos seres humanos muito antes de participarmos desta ou daquela religião é algo totalmente desconsiderado pelo radical suicida, sendo que isso deveria ser uma lei mundialmente reconhecida e respeitada (sei que estamos muito longe disto). E é claro que tirar a vida de alguém “em nome de Deus” constitui uma desculpa bastante fácil para liberarmos toda a nossa fúria reprimida com base em uma visão de mundo rancorosa, distorcida e desequilibrada.
Mas esse extremismo só existe porque há, de uma certa maneira, uma base dogmática que legitima a proliferação indireta desses atos. O dogma, a fonte que alimenta o fanatismo, é a característica fundamental de todas as religiões que representa em si mesmo o conjunto de leis imutáveis que não permite o questionamento, o aprendizado com o reconhecimento honesto dos erros e acertos e, por último, o tão desejado avanço. Portanto, não se trata aqui de ser contra esta ou aquela crença específica e sim contra o paradigma maior no qual transitam todas as bases religiosas conhecidas (antes que alguém reclame, ressalto que menciono o cristianismo com uma certa frequência por ser uma religião muito presente em nossa sociedade, sendo um exemplo muito mais próximo e mensurável para nós).
O infeliz comentário possui os ingredientes básicos supracitados e é um exemplo do quanto que o fanatismo cega completamente uma pessoa, por mais que ela esteja rodeada por informação e tenha acesso ao conhecimento (já que a criatura que escreveu a pérola estava usando a Internet). Estabelecendo um forte vínculo emocional com os dogmas, o fanático não tem qualquer obrigação de ser coerente, sensato ou racional em suas atitudes, menosprezando, frequentemente com violência, qualquer visão de mundo diferente da sua.
Tenho convicção de que o teor presente no comentário anônimo é um fenômeno cada vez mais presente na sociedade brasileira e suspeito que isso pode se transformar em um problema de proporções gigantescas no futuro (para maiores informações sobre este tema, vide os posts "Evangelização" e "Segunda Idade das Trevas" com os seus devidos comentários). Quando a fé religiosa começa a se tornar mais importante do que a razão e a inibição de atitudes como a do dito comentário torna-se difícil por envolver um "assunto intocável" (lembram-se do dito popular: "política, futebol e religião não se discutem"?) o resultado é sempre a decadência dos valores humanos mais preciosos. Não deixemos que coisas como essa passem em branco...
Estimado Márcio, vou aguardar seu próximo post "Glória ao Senhor, minha única droga!" para comentar. Interessante o indivíduo ter usado o termo "droga", pois a relação da ação das drogas em nosso cérebro tem inúmeras semelhanças também com a ação da "fé" no mesmo. O princípio é muito semelhante. E acredito ser essa mais uma razão para que os dogmas façam tanto sucesso e sejam tão bem aceitos pela massa encefálica da massa popular. No aguardo...
ResponderExcluirRoni Adame