sábado, 24 de julho de 2010

Para Quem Acredita (parte 2)

Setembro de 1993. Vindo de uma adolescência de muita insatisfação e revolta, além de carregar um passado de forte influência místico-esotérica, chegava em minhas mãos um livro que viria representar um marco na minha vida. Em um período de apenas 1 semana, eu devorei o então recém-publicado “Os Semeadores de Vida”, obra de 413 páginas escrita pelo peruano Carlos Roberto Paz Wells. O livro narrava uma história completamente insana mas ao mesmo tempo fascinante de um grupo de jovens no Peru em 1974, os quais teriam tido contatos físicos e constantes com uma civilização alienígena. Os relatos de contato extraterrestre rodaram o mundo e atraíram jornalistas, um dos quais foi o hoje famoso escritor espanhol Juan José Benítez (Operação Cavalo de Tróia), o qual pouco tempo mais tarde seria protagonista de um encontro programado com os ETs por meio da intervenção desse mesmo grupo de jovens. Sua história foi relatada em uma extensa reportagem do jornal “La Gaceta del Norte” de Bilbao, Espanha, com o título “Não Estamos Sós”. A partir das experiências relatadas em meados da década de 1970, surigiu a Missão Rama, linha de trabalho que objetivava, dentre outras coisas, estender a oportunidade de contato à outras pessoas interessadas. No Brasil, o trabalho chegara pelas mãos de Carlos Roberto Paz Wells em 1977, um dos jovens peruanos que havia participado de toda a experiência e iniciara uma linha de trabalho mais complexa e audaciosa em nosso país.

O livro causou um profundo impacto em minha pesonalidade. E não era para menos. Ainda jovem, inocente e influenciado que eu era por uma forte bagagem místico-esotérica, é lógico que acreditei em toda aquela história como uma possibilidade real, ainda que achasse tudo aquilo muito louco. Todavia, há de se ressaltar que era a primeira vez que eu entrava em contato com um ponto de vista bem diferenciado de outros estudiosos que eu lera. Ele se aventurava a escrever não apenas sobre ufologia, mas também sobre uma abrangente gama de assuntos envolvendo o comportamento humano. Meu interesse inicial pelo livro foi logo recompensado pela oportunidade de assistir algumas palestras ministradas pelo próprio autor e fiquei bastante perplexo com o nível de inteligência, conhecimento e sensatez com que o peruano abordava questões tão abrangentes e polêmicas, algo muito diferente de tudo aquilo que até então eu tivera contato. Não se tratava de um religioso, um hippie, um místico, um guru ou um lunático e sim uma pessoa normal, na época diretor de marketing da Philco, com uma reputação séria a ser defendida e ao mesmo tempo uma coerência e profundidade incomuns, características que me deixaram bastante intrigado. Envolto pela atmosfera do livro e pela figura do Carlos que transmitia muita inteligência, seriedade e sensatez, mostei-me interessado em participar do trabalho, interesse que resultou em uma oportunidade real de integrar-me à Missão Rama do Brasil 2 meses depois. Mal sabia que a minha ingressão no grupo proporcionaria, 12 meses mais tarde, as condições para um encontro com um evento muito insólito em minha vida.

Novembro de 1994. Durante um feriado prolongado, eu estava presente em um acampamento selvagem da Missão Rama do Brasil no perímetro externo do Parque Nacional de Itatiaia, o qual ocupa parte da Serra da Mantiqueira no Estado do Rio de Janeiro. Estávamos afastados da civilização, instalados em um pequeno vale conhecido por Brejo da Lapa, situado a 2.100m de altitude. O lugar era maravilhosamente belo: cercado por montanhas, havia um lago rodeado em parte por um brejo, em parte por terra firme com vegetação rasteira e uma estrada de terra acidentada e de pouquíssimo movimento em um nível mais acima, a qual ligava de um lado o longo trajeto até o asfalto e do outro o caminho até o Parque Nacional de Itatiaia, onde fica o magnífico Pico das Agulhas Negras. Era noite e, naquela época, a região bucólica ainda era um refúgio atraente para a prática de acampamentos selvagens, antes do IBAMA proibir tal atividade na área por causa de visitantes inconsequentes que começaram a degradar o local. Éramos um grupo aproximado de vinte pessoas, sentados em forma de meia-lua perto do lago. A grande maioria das pessoas estava sentada de costas para a estrada, ouvindo nossa amiga Angélica, no centro da meia-lua, comentar sobre certas práticas orientais de respiração e relaxamento. Eu estava na outra extremidade da fileira de pessoas, as poucas que podiam contemplar parte da estrada de terra, junto com a minha namorada na época, Márcia, uma amiga chamada Regina e mais um rapaz cujo nome infelizmente eu não lembro.

Estávamos ouvindo a Angélica falar quando algo estranho chamou a minha atenção próximo a um trailer de um amigo nosso, parado na beira da estrada. Eu calculo que estávamos há mais ou menos uns 40 metros do trailer, quando uma luz branca muito tênue mas visível o suficiente para chamar a minha atenção começou a aparecer. Era incrível… Por detrás do trailer surgiu uma figura humanóide irradiando luz do próprio corpo que começou a caminhar pela estrada. Eu não podia acreditar no que estava acontecendo. Tentei localizar qualquer foco de luz que pudesse denunciar uma brincadeira por parte de alguém munido de um “projetor” mas não vi absolutamente nada. Não havia ninguém na estrada além daquela estranha figura. O que era aquilo? A despeito da perplexidade da visão, tive uma inesperada reação de ficar simplesmente quieto. Tinha a sensação, não sei por que, de que poderia perder o espetáculo caso fizesse qualquer estardalhaço. Só tive um impulso de cutucar a Márcia e perguntar em voz baixa se ela estava vendo a mesma coisa que eu, sendo também uma forma de conferir se eu não estava ficando louco. Para meu alívio, ela confirmou que estava vendo tudo também. Permanecemos quietos, atentos e de olhos bem abertos. Tratava-se da silhueta de uma figura humana esguia em forma de luz branca, concentrada, dando para perceber nitidamente a cabeça, o tronco, braços e pernas. Não era possível perceber detalhes tais como fisionomia, roupa, etc. Era como se a criatura fosse um holograma em movimento que emanava luz do próprio corpo, sem qualquer foco de luz visível para fora dos contornos de seus membros (algo parecido com a imagem deste post). Uma luz tênue contida nos perímetros de um formato humanóide, andando pela estrada de terra, sendo visivelmente mais alto que um ser humano comum (depois de terminada a estranha manifestação, calculamos que “a coisa” deveria ter uns 2,5 metros de altura aproximadamente, tendo como referência de comparação a altura do trailer).

Alguns segundos depois de efetuar sua caminhada, a criatura ou seja lá o que fosse parou e voltou-se para a nossa direção, como se soubesse que estávamos vigiando seus passos. Senti um arrepio correr pela espinha mas fiquei estranhamente calmo logo em seguida. Fiquei muito contente por estar observando algo tão diferente mas era um contentamento sereno, contido. Tive uma inesperada sensação de tranquilidade e a criatura começou a caminhar novamente. Um pouco mais para a frente, a luz começou a desvanecer-se, perdendo a sua nitidez original, como se fosse um canal de TV fora do ar e cheio de “chuviscos”, até desaparecer por completo diante dos nossos olhos atônitos. Chequei com a Márcia, com a Regina e com o rapaz ao meu lado após o final da explanação da Angélica e eles confirmaram tudo aquilo que eu tinha acabado de ver. Fiquei muito feliz mas ao mesmo tempo perplexo. Havíamos visto algo totalmente fora dos padrões de qualquer explicação natural, fora dos paradigmas socialmente ou cientificamente aceitos e ninguém acreditaria em nossa estória. Em tempo: estávamos alimentados, não havíamos tomado bebida alcoólica, nunca fomos usuários de drogas, sempre enxergamos muito bem e não estávamos com a expectativa de ver absolutamente nada, último detalhe que inviabilizaria uma suspeita de autosugestão. E embora estivesse certo sobre a natureza incomum do que acabara de observar, percebi que, se estivéssemos dispostos a dividir tal experiência com outras pessoas, deveríamos estar preparados para a inevitável ridicularização do nosso testemunho.

Ciente sobre a ridicularizão ou desdém que um relato sobre o ocorrido poderia causar na esmagadora maioria das pessoas, eu decidi diminuir a margem de erro. Eu queria livrar-me de qualquer possibilidade de engano ou mal-entendido. Foi quando pedi para a Márcia, a Regina e o rapaz ao meu lado permanecerem ali, no local da observação, pois eu gostaria de dirigir-me até a estrada para ver de perto por onde tal forma luminosa acabara de passar. O intuito era fazer o mesmo trajeto do humanóide para saber se não poderíamos ter confundido tal manifestação com algum fenômeno conhecido, tal qual a possibilidade de alguém estar andando por lá com uma lanterna acesa, por exemplo. Eu sabia que era plenamente capaz de diferenciar o estranho fenômeno de uma pessoa andando por ali com uma lanterna, afinal, já tinha visto pessoas passando por ali várias vezes durante a noite. Mas mesmo assim, insisti por pura precaução. Fiz o percurso várias vezes, hora munido de lanterna acesa, hora apagada; com a lanterna acesa dentro do meu casaco e fora dele; andando depressa e andando devagar… Enfim, esgotei todas as formas pelas quais alguém andando por ali pudesse causar algum “efeito visual” fora do normal. Voltei depois para o encontro da Márcia, da Regina e do rapaz e pedi para que me relatassem o que tinham visto. Os três comentaram que em nenhum momento eu sequer havia me aproximado daquilo que havíamos presenciado em conjunto. Para começar, a Márcia disse que eu aparentava ter quase a metade da estatura da coisa em formato de luz. E as peripécias com a lanterna e o casaco tampouco chegaram perto do efeito extraordinário que havíamos visto anteriormente. Senti um grande alívio novamente, afinal, havia confirmado a minha impressão inicial. Por mais que a maioria das pessoas ali presentes não tivesse visto o humanóide luminoso, por uma simples condição de posicionamento físico perante tal acontecimento, estávamos certos de que tínhamos confrontado nossas observações e de que não podíamos negar o que vimos. No dia seguinte ficamos sabendo que um pequeno grupo de pessoas acampadas em uma barraca morro acima, um pouco mais distantes do que nós, havia notado o estranho fenômeno também. Era mais uma confirmação de que não havíamos sido presas fáceis de um engôdo ou de um mal-entendido da nossa mente. Tínhamos apenas sido testemunhas oculares de uma realidade fantástica.

Carrego as lembranças deste evento por onde quer que eu vá. As vezes minha realidade cotidiana choca-se de frente com as lembranças dessa noite tão estranha e procura-se impor impiedosamente, tentando convencer-me de que não vimos o que vimos ou de que tudo não passou de um mero sonho. Se eu não tivesse eliminado certos detalhes passíveis de questionamento logo após o ocorrido talvez hoje fosse um pouco mais fácil convencer-me de que fora um terrível engano. Mas a realidade dos fatos não permite negar o que vimos, embora não saibamos o significado do que vimos.

E é assim que interpretações para “eventos fora do padrão” variam na mesma proporção que variam nossos inúmeros paradigmas, dando conotações místicas, esotéricas, espiritualistas, religiosas ou até mesmo “científicas” para fenômenos que não se encaixam em explicações convencionais. Ou seja, na pressa de achar uma resposta, construimos explicações prematuras baseadas em nossas próprias experiências, crenças e inclinações. Todavia, mesmo levando em conta as armadilhas da mecânica dos paradigmas, tive a impressão de que a aparição insólita tratou-se do subproduto de uma avançada tecnologia holográfica. E antes que os céticos se manifestem a respeito (eu mesmo me considero um deles), eu sei perfeitamente que o ambiente no qual eu estava inserido favorecia enormemente tal associação. Mas vale lembrar que, no momento da aparição, tanto eu quanto as outras pessoas não estavam esperando ver absolutamente nada, sendo também pertinente salientar que a criação de expectativas em relação a eventuais fenômenos estranhos sempre foi muito combatida na Missão Rama do Brasil. Em resumo, o evento pegou a gente de surpresa.

Outra questão importante a ser ressaltada é a de que, somente hoje, 15 anos depois do ocorrido, as primeiras experiências com hologramas nos moldes de "Star Wars" estão sendo efetuadas com sofisticados aparatos tecnológicos, elementos que não exisitiam na época, muito menos ainda em uma estrada de terra sem iluminação no meio do mato e a qual foi checada por mim na sequência do evento com o intuito de encontrar qualquer forma de embuste (e não encontrei absolutamente nada!). Então, de que raio de tecnologia eu estaria falando? A questão desconcertante perturbou-me durante 15 anos e somente hoje vem ter um espaço neste blog, ambiente cuja proposta básica é a consideração da famosa pergunta inglesa “what if?”, como forma de darmos asas ao questionamento criterioso. Ou seja, e se considerarmos, mesmo como sendo uma hipótese altamente improvável, a possibilidade de que o evento insólito descrito anteriormente tenha sido o subproduto de uma tecnologia extraterrestre?

Já posso sentir o sorriso de desdém daqueles que lêm este post ao imaginarem automaticamente que sou mais um lunático neste mundo de gurus e charlatões falando sobre ETs. Mas peço somente um pouco da sua atenção para considerarem a interpretação do que eu vi como uma possibilidade e não a afirmação categórica de que tive um “contato”. Primeiramente, porque embora eu tenha absoluta certeza do que vi, não tenho certeza daquilo que estaria por trás do evento e talvez nunca venha a saber as reais causas daquilo que meus olhos testemunharam. Em segundo lugar, especular sobre a possibilidade de haver vida ou até mesmo a talvez rara vida inteligente além dos limites da Terra abre caminho para a uma boa reflexão sobre como a vida teria se originado em nosso próprio planeta. E não seria somente a segunda consideração um benefício muito válido para não descartarmos prematuramente a hipótese extraterrestre? Levando em conta tudo aquilo que eu escrevi nos posts “Para Quem Não Acredita” e “Para Quem Acredita (parte 1)” (aconselho a paciente leitura de ambos pois são posts interrelacionados), façamos um esforço para além do condicionamento de rejeição automática da idéia. 

É natural o posicionamento cético perante declarações ou especulações tão fantásticas como esta. Eu mesmo me questiono o tempo todo a respeito do que vi mas, o que eu gostaria de salientar, é o contraponto representado pela mecânica dos paradigmas em nosso comportamento diário de distanciamento e indiferença perante as coisas que não vemos, não sentimos ou não percebemos. Se certas pessoas vivem situações perante as quais a ciência ou religião oficial não conseguem dar nenhuma explicação satisfatória, ou se eventos “oficialmente aceitos” ocorrem do outro lado do planeta, isso não parece ser algo real para nossa vidinha particular. Como na história de São Tomé, só acreditamos naquilo que podemos tocar, colocando-nos arrogantemente como referência para aquilo que acontece ou deixa de acontecer no universo. Como pode algo assim existir ou ocorrer sendo que eu nunca fiquei sabendo ou fui avisado? E com a licenca de René Descartes, a equação para a nossa arrogância é bastante simples: “não vejo, logo não existe”. 

A despeito de toda a controvérsia que eu sei que o assunto fomenta, envolvendo de um lado as ridicularizações mais infantis e de outro as reações emocionais mais fanáticas, típicas do universo esotérico/ufológico, não podemos negar que o tema, quando explorado de forma equilibrada, pode ajudar-nos a ter uma visão mais questionadora a respeito de nós mesmos. 

E termino por aqui com uma notícia que li no site Foxnews.com, a qual diz que os cientistas da Missão Kepler declararam no dia de hoje que resultados preliminares da missão indicam uma contagem inicial de um pouco mais de 700 novos planetas extrasolares. Embora ainda sejam dados que requerem confirmação, os cientistas estão empolgados com os resultados, os quais indicam que dos 700 planetas descobertos, 140 constituem planetas rochosos com características similares às da Terra. Isso sugere que planetas como o nosso são muito mais comuns do que se imaginava, ressaltando ainda mais a mudança de paradigma na comunidade científica no que se refere a aceitação da possibilidade de não estarmos sós no universo (vide o post "Para Quem Não Acredita" para maiores detalhes). 

Abs,
Marcio

sábado, 17 de julho de 2010

Para Quem Acredita (parte 1)

No post anterior eu abordei a questão da mudança de cenário no que se refere à ciência oficial aceitar a possibilidade de não estarmos sós no universo, seja na condição de formas de vida bacteriana, formas mais complexas ou até mesmo civilizações extraterrestres. Todavia, existe um grande grupo de pessoas que não somente leva essa possibilidade facilmente em consideração há bastante tempo, como está convicto de que estamos sendo visitados por ETs, que é possível estabelecer contato com tais entidades, saber quais seriam seus objetivos e ainda cultivar um ar de superioridade pelo posicionamento "tão cético e primitivo" da ciência oficial em relação ao assunto. Se você se identifica com esse perfil, este post foi escrito especialmente para você.

Antes da “fenomenologia ufológica”, existe o que eu chamaria de “fenomenologia humana”, questão sobre a qual ninguém menciona nada, sendo a mesma fundamental no entendimento do universo ufológico. Dentro dos meios esotéricos bem como na ufologia assim chamada de “mísitica” (classificação, aliás, que eu acho estúpida), encontramos muitas informações que falam abertamente sobre frotas de naves extraterrestres (de acordo com os seguidores de Ashtar Sheran, suposto comandante extraterrestre, este seria responsável por uma frota de 15 milhões de naves!), inúmeros seres desta e de outras dimensões, constante monitoramento e profundo interesse por parte dos ETs pela raça humana. Além disso, “parcerias” entre o governo americano e os chamados “greys”, “parcerias” entre a Fraternidade Branca e os ETs de “dimensões mais elevadas”, “intraterrenos” e até “ultraterrestres” (o que seria isto afinal?) borbulham em livros, palestras, vivências e vigílias de grupos mistico-esotéricos. Existe uma farta literatura por aí especulando não somente sobre as origens mas também sobre as intenções e atividade de diversas civilizações, sejam elas físicas ou extrafísicas, todas elas com suas atenções voltadas para o planeta Terra. A Internet mesmo é um vasto meio de proliferação dessas idéias e explicações sobre o que seriam e quais seriam as intenções dessas entidades extraterrestres abundam sem controle algum. Se fosse possível catalogar todo material diponível sobre essas crenças, ficaríamos surpresos com a absurda quantidade de seres extraterrestres das mais variadas procedências e condições diferenciadas de existência que é apregoada por aí, sendo que, na somatória, todos teriam interesse nos rumos da raça humana e do planeta Terra.

Mas será que é isso mesmo? No post “Ufologia Dissecada” eu abordo um tema que questiona o seguinte: se toda a fenomenologia dita “ufológica” for levada em consideração, o planeta Terra só pode ser considerado o lugar mais interessante do universo. Seria a Terra, portanto, um lugar muito especial? Vamos ver...

Do ponto de vista do vídeo Pálido Ponto Azul, o qual faz parte do post de apresentação deste blog, a Terra não é nenhum lugar especial. Situados na periferia da Via Láctea contornando uma estrela que está muito longe de ser a maior da galáxia, somos um minúsculo grão de areia em uma praia descomunal. É comum na literatura esotérica o chamamento de atenção para o perigo da raça humana terminar em um grande conflito nuclear, e que a destruição da Terra, através de uma guerra com arsenal atômico, causaria danos às civilizações extraterrestres. Nisto residiria o fato de algumas civilizações extraterrestres estarem monitorando as atividades humanas, com o intuito de evitar uma eventual catástrofe. Este tipo de argumento, embora comum, não passa de um mito pois existem explosões de magnitude infinitamente maior em estrelas gigantes se comparadas com o nosso Sol (de 50 a 100 vezes o tamanho da nossa estrela!), as quais ocorrem o tempo todo no universo. Até onde sabemos, nenhuma delas está sequer perto de afetar minimamente o equilíbrio do universo. Portanto, a pergunta que parece óbvia é a seguinte: porque uma eventual explosão de um planetinha tão diminuto quanto a Terra poderia ter qualquer importância para uma civilização extraterrestre?

Ao assistir um vídeo sobre o documentário do Discovery Channel intitulado “Alien Planet”, eu observei o físico Michio Kaku abordar esta questão com muita lucidez e humildade. Segundo o físico, é possível que haja civilizações extraterrestres muito mais avançadas em nosso universo mas, para a tristeza de muitos humanos, seu interesse por nós seria muito questionável. Ele utilizou uma analogia para exemplificar nossas diferenças, representadas pela distância entre nós e as formigas, supondo que nós, terráqueos, fossemos as formigas e os ETs fossem os humanos. Em nosso hipotético exemplo, foi contruída uma rodovia ao lado de um formigueiro. Do ponto de vista da formiga, há qualquer consciência sobre a existência de uma rodovia, carros e, obviamente, seres humanos dentro desses carros? Existe qualquer interesse por parte da colônia de formigas em detectar seres humanos? Existiria tecnologia na colônia de formigas capaz de detectar a presença de seres humanos e depois estabelecer qualquer forma de contato com eles? E do ponto de vista humano: existe qualquer interesse nas formigas ao lado da rodovia? Estaríamos interessados nelas ou passaríamos por cima das mesmas sem nem perceber que elas estão em nosso caminho? Ou pior: justamente por percebê-las é que teríamos o desejo de eliminá-las?

Não quero ser estraga prazeres do exército de crédulos, insinuando que de toda a fenomenologia ufológica apresentada, nada se salva ao ponto de não sobrar nenhuma possibilidade de estarmos sendo visitados por alienígenas. Se nós já enviamos sondas espaciais e missões robóticas para outros planetas com uma certa frequência e sucesso, imagino que civilizações muito mais antigas possam fazer o mesmo com muito mais competência. Destas maneira, não posso descartar essa possibilidade. Todavia, há de se frisar que tal possibilidade deveria ser em uma proporção imensamente menor ao que é apregoado por aí pelos ufólogos, não importa a linha de interpretação (científicos ou místicos pela estúpida classificação). E com relação aos objetivos das poucas visitas que talvez pudessem ser consideradas, suponho que estas não deveriam ter necessariamente qualquer vínculo com os interesses dos seres humanos. Do ponto de vista alienígena, é possível que estivessem interessados em suas próprias pesquisas, as quais poderiam até envolver seres humanos, mas não pelos motivos que gostaríamos que fossem. Por mais duro que isso possa parecer, a verdade não tem necessariamente qualquer ligação com os nossos desejos, carências, aspirações e megalomanias enebriantes.

Se por um lado, há muitas coisas para além das quais nossa ciência ainda é incapaz de trazer respostas satisfatórias, por outro, existe uma imensa infinidade de crenças, sejam elas místicas, esotéricas, religiosas ou ufológicas que, justamente por serem apenas crenças, só desinformam e desorientam ao invés de trazer o tão almejado conhecimento para a gente. E tais crenças, infelizmente, ocupam a maior parte do material escrito e divulgado em livros, palestras, vídeos, encontros, vivências em grupo e outras manifestações populares. Desta maneira, creio que o nosso papel é o de sermos garimpeiros criteriosos, selecionando muito bem o que lemos, vemos e ouvimos de outros e trabalhando arduamente na "construção do nosso próprio conhecimento", sem deixar-nos influenciar pelo religioso V, pelo guru X, pelo movimento Y ou pelo ufólogo Z.

A comparação é sempre uma ferramente muito válida e, ao observar as pessoas à minha volta, pude notar o pouco conhecimento histórico que possuímos. Não se trata apenas de uma ignorância generalizada sobre História Antiga mas também uma falta de conhecimento sobre nossa história recente, fator ainda mais pertubador na minha opinião. Por exemplo: a Internet é parte integrante de nossas vidas, utilizamos a grande rede todos os dias e é impressionante o quanto que nós desconhemos sobre os inúmeros esforços, descobertas e conquistas em diferentes campos do conhecimento humano que tiveram que ocorrer para viabilizar o uso da Internet da forma como nós a conhecemos hoje. Nós apenas sentamos na frente do computador e utilizamos a grande rede, sem fazer idéia do quanto isso é revolucionário. Peguem qualquer artigo sobre a história da tecnologia e vocês terão uma idéia do que estou tentando transmitir. Em outras palavras, 50 anos de história já parecem ser coisa demais para nossas humildes cabecinhas, preocupadas que elas estão com os problemas diários e a sobrevivência quase sempre com muito sacrifício. Agora, imaginem uma civilização não com 100 ou 200 anos de desenvolvimento a nossa frente mas sim uns 100.000, 200.000 ou até mesmo 1 milhão de anos à nossa frente. Somos péssimos para lidar com números, então, cito os 6.000 anos de civilização humana só para pôr essa questão em uma perspectiva mais realista. Um milhão de anos seria absurdamente mais do que toda a história da civilização humana reunida, a qual a maioria de nós desconhece em maior ou menor grau. Qual seria então a história de uma civilização com 1 milhão de anos? Que processos, dificuldades e privações tiveram que enfrentar? Qual seria o real tamanho de suas conquistas civilizatórias? O que descobriram, inventaram e superaram ao longo de tanto tempo? Qual seria a visão de mundo e de vida desses seres? Qual seria o poder dessas civilizações? Se foram necessários 6.000 anos de civilização para chegarmos ao ponto de tentar descobrir se existem planetas como o nosso nas imediações da nossa galáxia (vide as informações sobre a Missão Kepler no post "Para Quem Não Acredita"), qual seria o tempo de existência e o poder correspondente de uma civilização capaz de deslocar-se por distâncias tão absurdas, as quais nós ainda nem vencemos com o alcance do olhar dos nossos mais avançados telescópios!?!?!

Uma especulação que eu gosto de fazer, baseado nas hipóteses sobre o tempo de existência das civilizações mais avançadas (novamente a escala Kardashev), e em conformidade com o nome deste blog, é tentar perceber as coisas sob o ponto de vista de uma hipotética civilização extraterrestre. Explico: se nós, terráqueos, tivéssemos a oportunidade de estudar um planeta distante com uma população de macacos alienígenas, de que forma agiríamos? Supondo que eu fosse algo parecido com um biólogo ou psicólogo behaviorista, talvez eu quisesse observar de perto o comportamento desses macacos sob 2 perspectivas diferentes: observando-os em suas condições naturais, sem qualquer tipo de intervenção, ou aplicando-lhes diferentes estímulos. E entendam estímulos aqui como um "contato" da nossa parte. Sim, imaginem um suposto contato alienígena como um estímulo e/ou intervenção, com o objetivo de efetuar alguma espécie de análise ou estudo. E apesar do argumento sempre presente de que "os ETs respeitam nosso livre-arbítrio" (idéia comum nos meios ufológicos), é preciso lembrar que intervimos sempre no reino animal com nossas próprias pesquisas, mesmo que estejamos apenas filmando um macaco à distância no meio da selva para produzir um documentário. Do ponto de vista do macaco, poderíamos parecer "alienígenas" com uma avançada tecnologia de monitoramento.

E já posso ouvir aquele velho argumento dentro da minha mente por parte dos crédulos: "mas será que eles não fizeram pesquisas o suficiente neste planeta com a gente? Não posso aceitar tal hipótese." Quanto a isso, eu diria o seguinte: em primeiro lugar, não temos moral para ser contra supostas pesquisas alienígenas, uma vez que nós mesmos fazemos isso o tempo todo, seja com seres humanos ou com animais. Em segundo lugar, partindo do pressuposto de que somos visitados por entidades alienígenas, não temos condições de saber se foram feitas muitas pesquisas ou não (não temos acesso ao banco de dados alienígena para saber há quanto tempo isso estaria sendo feito). Em terceiro lugar, existe uma premissa muito errada de que o conhecimento é finito e, a partir de certo momento, qualquer estudo ou análise deixam de ser necessários porque partimos do princípio que "já aprendemos tudo sobre determinado assunto". Falácia inocente da nossa mente. Se assim o fosse, estaríamos plenamente satisfeitos com as explicações sobre nossa origem e vida que são encontradas às pencas na Bíblia. Além disso, nossa tecnologia se desenvolve exponencialmente a cada dia, revelando-nos aspectos da vida que até então eram completamente desconsiderados. Portanto, voltemos à experiência com os macacos alienígenas.

Se a hipótese de que estamos sendo visitados for correta, não seria nem um pouco insensato pensar que pareceríamos fósseis vivos para tais civilizações. Lembrem-se do exemplo das formigas e vocês entenderão onde quero chegar com isso. Utilizando mais uma vez a comparação, não seríamos mais do que macacos superdesenvolvidos para tais seres, com comportamento agressivo, temperamento altamente emotivo, limitação mental, baixa expectativa de vida, desorganizados socialmente, predominantemente supersticiosos e com um estilo de vida inegavelmente suicida. Como no exemplo das formigas, o distanciamento entre nós e eles seria tão incomensuravelmente grande que inviabilizaria qualquer conversa ou outra forma de comunicação. Não acredito que a comunicação em si seria o problema e sim a ausência de referências, de padrões de comparação viáveis ao nosso entendimento. Ou se por um acaso eles tomassem a iniciativa de um contato, com um suposto "conhecimento do nosso nível de entendimento", nossa capacidade de distorção, devido às nossas limitações, estragaria qualquer tipo de diálogo.

Isso trás à tona uma outra questão muito polêmica para os crédulos: a crença de que algumas pessoas estariam recebendo mensagens dos extraterrestres por vias telepáticas. Em conformidade com o parágrafo anterior, fica muito difícil aceitar o conteúdo dessas supostas mensagens, as quais parecem proliferar como uma doença nos meios místico-esotéricos. Mensagens com conteúdo previsível, visivelmente influenciadas pelo contexto humano e com uma forte carga de influência messiânica-religiosa. Como poderia, por exemplo, uma civilização extraterrestre sabe-se lá quanto tempo mais avançada que a nossa entrar em contato conosco para endossar nossas crenças, reforçar nossas superstições, ressaltar nosso ego e causar ainda mais ignorância ao "dizerem que devemos seguir nossos mestres terráqueos"? Se seguir tais ensinamentos fosse a resposta para nossos problemas, há muito nosso planeta teria se transfomado em um lugar melhor para se viver. Levando-se em conta o distanciamento ressaltado pela analogia da formiga, fica extremamente óbvio que as pessoas estão, mesmo incoscientemente, criando essas mensagens dentro das suas próprias cabeças do início ao fim. Não há, na esmagadora maioria dos casos, qualquer evidência de um eventual contato alienígena, por mais que as pessoas estejam afetadas emocionalmente pela "experiência". Mesmo se houvesse uma possibilidade de contato real por vias telepáticas, a mensagem resultante teria enormes chances de ser distorcida pela nossa mente, comprometendo seriamente o conteúdo original.

Desta maneira, termino este post da mesma forma que terminei o post "Para Quem Não Acredita". Longe de querer encerrar a questão abordada, ficará a critério do leitor chegar às suas próprias conclusões, as quais serão inevitavelmente temporárias. Explorando o outro lado da balança, do ponto de vista de quem acredita nos discos voadores, deixo aqui o meu profundo alerta sobre um assunto que há muito virou um dogma de fé. Na verdade, este post terá uma sequência onde tratarei melhor deste ponto, ficando aqui apenas uma reflexão: apesar do aparente pessimismo em relação a espécie humana, eu acredito sim em um futuro melhor. Mas acredito que o mesmo só será realizável, quando a gente descer do nosso enorme pedestal e encarar humildemente a nossa condição de completa ignorância.

Abs,

Marcio

domingo, 4 de julho de 2010

Para Quem Não Acredita

Se você é daqueles que torcem o nariz quando ouvem a palavra "extraterrestre", dá muita risada quando alguém confessa que viu um disco voador, não consegue parar de fazer piada com os "verdinhos" e acha que as missões espaciais deveriam ser interrompidas pois altas somas de dinheiro envolvidas seriam melhor aplicadas no combate à fome do mundo, este post foi escrito especialmente para você.

Até 1995, havia boas razões para os cientistas acharem que a existência de planetas fora do Sistema Solar era uma hipótese praticamente nula. Condições especialíssimas na Terra bem como a ausência de uma tecnologia capaz de detectar corpos celestes tão diminutos se comparados com suas estrelas-mãe à distâncias tão descomunais davam poucas esperanças para os cientistas. Muitos inclusive acreditavam ser tal busca uma completa perda de tempo. Mas no dia 06 de Outubro de 1995, dois astrônomos suiços acharam o primeiro planeta orbitando a estrela Pegasi 51, na constelação de Pegasus. A descoberta foi viabilizada pela técnica conhecida por Velocidade Radial, a qual baseia-se na oscilação do campo gravitacional de uma estrela pela interferência de um corpo celeste em suas proximidades (efeito wobble). Desde então, 464 planetas extrasolares foram descobertos utilzando diferentes técnicas, estas últimas incentivadas em parte pela pioneirismo da primeira descoberta. E se a consideração da existência de vida alienígena era algo apenas possível em filmes de ficção científica, hoje a busca por vida extraterrestre virou uma pesquisa científica muito séria.

Com o lançamento do telescópio espacial Kepler em Março de 2009, a NASA objetiva encontrar planetas similares à Terra, posto que os planetas extrasolares encontrados até o momento tratam-se daquilo que os astrônomos chamam de gigantes gasosos, com características similares ao planeta Júpiter. Com a capacidade de observar 150.000 estrelas simultaneamente a cada 30 minutos utilizando a técnica de trânsito (a qual consiste em observar a diminuição no brilho de uma estrela devido a passagem de um corpo celeste pela sua frente de forma periódica, configurando assim uma órbita), a razão da busca por planetas com caracteristicas similares ao nosso é a maior probabilidade de encontrarmos vida tal qual a conhecemos. Tais características incluem tamanho, composição física, atmosfera e uma posição na assim chamada "zona habitável", uma faixa de distância similar entre os planetas Vênus e Marte com a Terra bem no meio, localização que possibilitaria a existência de água em estado líquido. Com isso, a NASA objetiva saber se planetas com condições de abrigar a vida são comuns ou, muito pelo contrário, a Terra é uma total raridade. Se planetas como a Terra forem comuns, talvez a vida seja, da mesma forma, algo comum no universo. Os primeiros resultados concretos da missão, de acordo com a NASA, só aparecerão daqui há 2 anos.

Estima-se, com base na projeção da quantidade de planetas extrasolares que vem sendo descobertos nas "proximidades do Sistema Solar", que a nossa galáxia poderia conter cerca de 30 bilhões de sistemas planetários e talvez o mesmo número de planetas rochosos similares à Terra. Mas o mais sensato, obviamente, é aguardar pelos primeiros resultados da Missão Kepler antes de falarmos sobre os números envolvidos.

O contraponto dessa busca por vida alienígena baseia-se na seguinte indagação: até que ponto a vida poderia se adaptar a diferentes condições do universo? Mesmo porque, até nosso conceito de "vida" ainda é algo muito limitado, posto que só temos o planeta Terra como referência na imensidão do cosmos. Partindo desse princípio, surgiu a astrobiologia, a qual é o ramo da ciência que estuda e pesquisa como a vida poderia surgir no universo, grande parte do tempo pesquisando sobre as origens da vida aqui mesmo na Terra por questões óbvias de facilidade de acesso.

Visitando regiões inóspitas do planeta como crateras de vulcões, cavernas muito profundas, regiões polares, desertos e fossas oceânicas para descobrir como a vida pode se desenvolver em condições tão severas, os cientistas descobriram as fantásticas bactérias extremófilas, organismos que são capazes de se desenvolver em condições até então impensadas de temperatura, iluminação, pressão, salinidade, acidez, etc. Já que as condições fora da Terra são extremamente diferenciadas, foi preciso ter acesso às regiões extremas do planeta para tentarmos nos aproximar ao máximo do que seria a atmosfera de uma planeta como Marte ou Vênus ou outros corpos celestes como asteróides e cometas. Estudando como esses organismos se desenvolvem, os astrobiólgos acabam por encontrar respostas de como a vida surgiu aqui na Terra também.

Até o momento foram catalogados 17 espécies de organismos extremófilos, os quais vão desde criaturas vivendo dentro de rochas a kilômetros de profundidade da superfície até seres capazes de sobreviver à radiação nuclear. Se antes os cientistas tinham grandes dificuldades em aceitar que a vida poderia se adaptar à condições tão variadas, hoje isso está sendo radicalmente revisto e abre caminho para possibilidades mais amplas. Quem quiser conferir alguns documentários muito interessantes sobre astrobiologia, busca por planetas extrasolares ou busca por vida alienígena eu recomendo o "BBC Space: Are We Alone?", "Discovery Science: First Alien Encounter", "The Universe: Astrobiology", "The Universe: Alien Planets" e "The Universe: Search For ET", apenas para citar alguns.

Mesmo "na rua da nossa casa", nossas bem-sucedidas missões robóticas espaciais têm demonstrado que alguns dos nossos vizinhos do Sistema Solar são bons candidatos para abrigar formas de vida primitivas como organismos unicelulares. Marte já possuiu rios em sua superfície e existem boas chances de haver organismos microscópicos sob o solo. As luas de Júpiter e Saturno (Europa e Titã, respectivamente), por sua vez, apresentam boas condições de abrigarem vida primitiva e, falando do último orbe, Titã vem atraindo a atenção dos investigadores pelas condições singulares que reúne. Trata-se da única lua conhecida que possui uma atmosfera propriamente dita, e o único objeto celeste (além da Terra) em que sabe-se da existência de "mares" - grandes concentrações de matéria em estado líquido na superfície. Em 2004 a missão Cassini-Huygens descobriu lagos de hidrocarbonetos (moléculas à base de carbono e hidrogênio) nas regiões polares. A superfície do satélite é suave - ao contrário da superfície da Lua, cravejada de crateras - e até parecida com a da Terra, moldada por ventos, chuvas e tempestades de metano. Por estes motivos, tem sido frequentemente apontado como um dos locais mais prováveis para encontrarmos os primeiros sinais de vida extraterrestre.

Em que pese aqui as abissais diferenças ente vida extraterrestre bacteriana e vida extraterrestre mais complexa como animais, por exemplo, muitos cientistas estão à anos-luz a nossa frente no que se refere a visualizar como seriam tais formas de vida hipotéticas. O renomado documentário "Alien Planet", do Discovery Channel, explora essa questão embasado em muito conhecimento técnico, apresentando uma missão não-tripulada em direção ao imaginário planeta Darwin IV, o qual abriga formas complexas de vida alienígena. Se nós, com todas as nossas limitações, já conseguimos projetar programas espaciais desse tipo para o futuro, do que seria capaz uma hipotética civilização à centenas ou talvez milhares de anos a nossa frente? Será que já não estamos sendo visitados por missões espaciais alienígenas não-tripuladas? A despeito do risco de tendenciosidade que posso estar transmitindo no momento com tais especulações, peço a paciência dos meus leitores para que esperem eu explorar isso de uma forma mais adequada no próximo post: "Para Quem Acredita", o qual estará intimamente relacionado a este.

Mesmo "dentro da nossa casa", iniciativas como a do SETI (Search For Extraterrestrial Intelligence) Institute, organização científica sem fins lucrativos fundada em 1984 com o intuito de detectar sinais de vida extraterrestre inteligente por meio de ondas de rádio, mostram o quanto alguns cientistas estão otimistas. A despeito de alguns senões por parte da comunidade científica oficial sobre as motivações do SETI Institute terem sido simplistas no início, hoje a instituição encontra-se muito mais madura e preparada para o enorme desafio, apresentando 3 centros científicos. Dois desses centros efetuam pesquisas em áreas como astronomia, astrobiologia, teoria da informação, invovações tecnológicas e a busca por inteligência extraterrestre propriamente dita através de radiotelescópios. O outro centro é responsável por projetos educacionais, dos quais destaca-se o programa de rádio semanal intitulado "Are We Alone?" para, sobretudo, divulgar o trabalho do SETI e popularizar a ciência.

Apesar de cientes das enormes diferenças entre vida extraterrestre complexa (algo parecido com animais) e vida extraterrestre inteligente (algo parecido com humanos), o pessoal do SETI confia plenamente na possibilidade de haver civilizações lá fora, as quais possuiriam totais condições de entrar em contato conosco. Só para expandirmos um pouco essa idéia, conforme sugeriu Nicolai Kardashev, renomado astrofísico e ex-diretor do Instituto de Pesquisa Espacial Russo, no esquema de classificação que leva seu nome, podem existir 3 tipos de civilizações no universo: Tipos 1, 2 e 3. Uma civilização Tipo 1 englobaria uma civilização que dominasse os recursos naturais de seu próprio planeta, utilizando toda a energia disponível em seu próprio mundo. Uma civilização Tipo 2 seria capaz de dominar os recursos energéticos de sua própria estrela além de colonizar seu próprio sistema solar. O Tipo 3 teria um alcance além do seu próprio sistema solar e teria como fonte energética os recursos disponíveis em toda sua galáxia. Kardashev sugeriu que este último tipo de civilização poderia ter milhões ou até bilhões de anos de existência (algo paradoxal se comparado com nossos míseros 6 mil anos de existência desde os Sumérios, na Mesopotâmia).

Essa escala de classificação foi proposta em 1964 e é utilizada até hoje pelo
SETI Institute. Inicialmente, Kardashev estimou que nós estaríamos na classificação zero desta escala e depois Carl Sagan redefiniu a fórmula original, estimando que seríamos uma civilização nível 0.7. De qualquer maneira, mencionei a escala de Kardashev com o intuito de ilustrar que pode haver de tudo por aí: desde civilizações primitivas (nós estaríamos mais perto do lado primitvo do que do lado avançado da escala) até civilizações com milhões ou até bilhões de anos de existência.

Como somos muito fracos para números e só para ilustrar muito debilmente as enormes diferenças entre as civilizações hipotéticas aqui classificadas, vamos analisar toda a geração de benefícios resultantes de uma missão espacial tripulada, por exemplo, já que muita gente ainda questiona veementemente a necessidade de explorarmos o espaço. O argumento de que seria muito mais útil gastar o dinheiro investido em missões espaciais no combate à fome na África, embora bem intencionado, é bastante simplista e limitado. Por exemplo: entre transferir recursos de uma missão espacial e os recursos da indústria bélica para um projeto cujo objetivo seja acabar com a fome, eu sou muito mais a favor da segunda opção. Além disso, acabar com a fome não resolve o problema das regiões castigadas pela extrema pobreza. Seria necessário ir muito mais além, fomentando a educação, controlando rigorosamente a natalidade, gerando emprego e moradia, tudo de acordo com as boas práticas de desenvolvimento sustentável. Por outro lado, a exploração científica nunca é uma iniciativa inútil e, se formos buscar as informações sobre os benefícios resultantes do avanço da tecnologia aeroespacial bem como das investigações científicas envolvidas, tanto na Terra quanto no espaço, vamos achar muitas aplicações na melhoria das condições humanas (confira alguns destes benefícios no site da NASA). Ou seja, é preciso haver desenvolvimento tecnológico para gerar desenvolvimento econômico. E sem desenvolvimento econômico, não há como combater a fome bem como outros problemas sociais.

Outro fator que é quase sempre ignorado é a amplitude de conhecimento técnico e/ou intelectual fomentado pelo desenvolvimento da exploração espacial. Por exemplo: ao avaliar todos os detalhes possíveis em uma missão espacial tripulada, vemos que existe um universo de coisas em jogo por estarmos lidando com condições hostis para a vida humana. Existem muitas equipes de altíssimo nível técnico trabalhando em diferentes estágios da missão para garantir que tudo dê certo e que nenhuma falha resulte em perda de milhões de dólares em investimentos ou pior: resulte em perda de vida humana. A fórmula certa de combustível, o traje adequado, a alimentação correta, toda a tecnologia envolvida, aperfeiçoamentos que precisam ser testados, tarefas que precisam ser executadas, procedimentos de segurança que precisam ser criados e seguidos, enfim, esta lista é demasiadamente longa... Fora isso, existe todo o preparo físico, mental e psicológico dos astronautas, os quais devem zelar também para que todos os detalhes envolvidos sejam considerados e que em um momento de crise essas pessoas possam estar aptas à resolver eventuais problemas, os quais são geralmente de caráter fatal.

Quando falamos de missões robóticas, então, o nível de complexidade técnica envolvida é muito maior, posto que tudo deve ser previsto (inclusive problemas, falhas, eventuais consertos, planos A,B,C, etc.) de forma a ser meticulosamente controlado à distância. Assim, apesar dos míseros 0.7 pontos que "ganhamos" na classificação de Kardashev, o conhecimento técnico envolvido nessas missões é algo que a maioria de nós sequer "arranha" e talvez nunca venha a "arranhar". Tentem agora imaginar uma civilização nível 3 e presumam o distanciamento em relação a nós, pobres terráqueos...

Seja um hipotético contato com uma civilização alienígena durante uma missão espacial, através do SETI Institute ou qualquer outro meio, tal evento poderia abrir espaço para reavaliarmos todas as nossas relações aqui na Terra. Isso porque seríamos obrigados a comparar nossa civilização com a deles se quiséssemos fazer um bom uso da oportunidade. Para fazer jus ao cenário científico, tecnológico e intelectual do momento deveríamos estar aptos a fazer algumas perguntas. Sugiro algumas logo abaixo:

Da onde é que eles vêm? Onde estão localizados os seus planetas de origem? Que tipo de tecnologia empregaram para superar as distâncias astronômicas aparentemente intransponíveis para nós? Depois, como são os seus mundos: sua constituição física, química, atmosférica, etc. E em seguida, as perguntas mais complicadas: como será a civilização desses seres? Quais serão os prodígios científicos e/ou tecnológicos alcançados pela estrutura de suas sociedades? A constituição social de seus mundos de origem é parecida com a nossa? Possuem algum sistema político predominante? Esse sistema poderia ser comparado com algum tipo de estrutura política empregada em nosso mundo? Como estão estruturados os seus meios de produção? Conquistaram aquilo que nós poderíamos denominar de modelo econômico ideal? Ou enfrentam algum distúrbio social como miséria, desemprego, violência, ou segregação? Lutam por alguma espécie de ideologia? Seguem à risca um determinado conjunto de valores morais? Possuem religiões? Acreditam em algum deus? Existe verdadeiramente alguma espécie de deus para eles? Depositam a fé em alguma coisa tida como superior? Ou acreditam tão somente naquilo que é possível lidar em seu cotidiano? Tiveram ao longo da sua história personalidades importantes como Jesus, Maomé, Buda ou algo parecido? Foram influenciados por alguma espécie de movimento místico e/ou esotérico? Acreditam em reencarnação? Descobriram coisas a respeito da vida que nós sequer desconfiamos? Qual é a visão de mundo desses seres? E com que objetivo teriam vindo ao nosso mundo?

Vemos que, mesmo para fazer esse punhado de perguntas muito simples, seria preciso saber perguntar, tendo como inevitável referência de comparação nossa própria sociedade e história. E em razão de todas as possíveis respostas para estas perguntas, será que estaríamos preparados para ouvir o que os extraterrestres teriam a nos dizer? Será que os nossos sistemas políticos, econômicos, sociais, culturais ou religiosos aguentariam incólumes o impacto causado por um provável choque entre duas realidades completamente diferentes? Será que as nossas autoridades bem como as corporações e/ou instituições mais poderosas do nosso planeta estariam dispostas a ceder espaço para uma nova ordem mundial emergente, já que é isso o que representaria, basicamente, a hipotética chegada de uma civilização extraterrestre em nosso mundo? Neste caso, em particular, não estamos falando apenas de tecnologia, mas também de um aspecto mais amplo que é o desenvolvimento da cultura. Ora, é possível imaginar a existência de uma tecnologia muito avançada sem o conceito básico de uma civilização para poder construí-la? Uma estrutura que foi capaz não apenas de manter um inimaginável conhecimento em diversas disciplinas mas também proporcionar a evolução de uma sociedade de forma organizada e sustentável. Uma civilização que teria conseguido superar barreiras para nós até hoje intransponíveis — como viajar pelo vastíssimo espaço e driblar a inabalável fronteira do tempo — , chegando até nós com uma tecnologia cujo conhecimento escapa totalmente da nossa atual capacidade de raciocínio só poderia ser considerada como avançada em toda a sua estrutura e não apenas "tecnologicamente", como alguns gostam de citar. Desta maneira, o início de um longo processo de comparação seria inevitável, estimulando a reflexão sobre aquilo que somos, sabemos, fazemos ou cremos com uma hipotética sociedade extraplanetária.

Não precisamos de um contato alienígena para fazer tais reflexões. Na verdade, já estamos fazendo esse exercício ao considerar todas as informações anteriores como pistas para uma eventual realidade ainda a ser descoberta. Longe de ter esgotado este assunto, termino aqui apenas por uma questão de cansaço. Na verdade, considerar tais questões como "assuntos esgotados" talvez seja uma premissa muito errada pois não se trata de uma questão de fé (acreditar ou não). Estar em um ou outro lado da balança, denota apenas um grande desconhecimento sobre os avanços que vêm ocorrendo nos meios científicos e inviabiliza qualquer discussão sobre o assunto. É por isso que este post não termina por aqui. É apenas o começo de uma estória a ser escrita por todos nós.

Abs,
Marcio