sexta-feira, 23 de outubro de 2009

Não Sabemos Nada

Ao assistir a série de documentários em andamento no History Channel chamada "Como Nasceu o Planeta Terra", refleti acerca de como nós, seres humanos, não sabemos absolutamente nada a respeito do mundo e da vida. Os episódios mostram, através de estudos geológicos, metereológicos e outras disciplinas correlatas, o que aconteceu em regiões específicas do nosso planeta (Deserto do Atacama no Chile, região de Nova Iorque nos EUA, Lago Ness na Escócia e Indonésia no Pacífico Sul até o momento) ao longo da linha do tempo. Só que a concepção de tempo geológico é completamente diferente da concepção humana, dando-nos uma absurda noção de insignificância diante da imensidão do tempo de existência do planeta Terra: 4,5 bilhões de anos!

O estudo dessas regiões revela-nos que a superfície do planeta mundou muito antes de nós botarmos nossos pés por aqui. Poderosos processos geológicos moldaram os continentes durante milhões de anos. O movimento das placas tectônicas geraram forças absurdas, elevaram grandes cordilheiras, geraram terremotos e expeliram muita lava através de erupções vulcânicas gigantescas. As eras glaciais mudaram completamente a superfície do planeta, influenciando correntes marítimas que, por sua vez, influenciaram o clima em outras regiões de forma interconectada.

Apenas a titulo de exemplo, a região de Nova Iorque, antes fazendo parte do extinto continente de Pangea, era formada por uma enorme cadeia de montanhas que depois foi destruída por uma geleira ainda mais alta ao longo de um processo demorado mas drámatico para a formação da região. Se fôssemos capazes de viajar em uma máquina do tempo para a região de Nova Iorque há alguns milhões de anos atrás, essa região seria absolutamente irreconhecível para nós não somente pela óbvia ausência de civilização, mas também pela drástica mudança em toda a paisagem natural.

Se por um lado o documentário "Como Nasceu o Planeta Terra" nos dá uma vasta visão do que foi o passado, outro programa do History Channel chamado "O Mundo Sem Ninguém" nos dá uma vasta idéia de como será o futuro. Nesta última série, é mostrado o que aconteceria com o mundo se, repentinamente, toda a humanidade desaparessesse. O documentário simula o que aconteceria ao longo dos anos, com as cidades sendo tomadas por plantas e animais e as construções ruindo por causa do castigo das intempéries e da falta de manutenção. Em poucos anos sem humanos, as metrópoles ficariam bem diferentes e tudo o que fosse construído pelo homem ruiria após poucas centenas de anos. Após 1000 anos sem ninguém (tempo que para o planeta Terra não significaria praticamente nada), não haveria mais nenhum sinal visível de que o mundo fora outrora habitado por criaturas inteligentes. Se o nosso mundo fosse visitado por seres de outros planetas, seria preciso uma investigação mais minuciosa para descobrir os restos de fundação das edificações sob a espessa vegetação e deduzirem em seguida que a Terra fora outrora o lar de uma civilização. Enfim, as estimativas científicas apontam para uma longa jornada de mais 5 bilhões de anos para o planeta Terra (tempo limite imposto pela morte do nosso Sol), não fazendo a menor diferença se havará ou não seres humanos para ocupá-la.

Todas essas informações me fizeram pensar em uma linha do tempo contínua, na forma de uma régua de alguns kilômetros e na qual a nossa espectativa de vida (por volta de 100 anos), um pouco estendida para ser honesto, fosse representada por apenas 1 milímetro no meio da régua. Mantenham bem esses valores em suas mentes: 100 anos representados em 1 mísero milímetro e 2009 como ponto de partida. Proporcionalmente, o nascimento oficialmente aceito de Jesus Cristo estaria localizado à uma distância aproximada de 2 centímetros antes da nossa marcação. O tempo de vida da civilização humana, conforme oficialmente aceita pelos meios acadêmicos, talvez pudesse representar algo em torno de 6 centímetros nessa régua. A existência do Homo Sapiens (o que conhecemos por Homem Moderno), representaria algo por volta de 20 centímetros antes da nossa marca. A existência dos dinossauros, espantosamente, ocuparia algo em torno de 160 metros nessa régua, finalizada dramaticamente pela queda de uma asteróide a 65 metros de nós. O tempo de existência do planeta Terra, 4,54 bilhões de anos, levaría-nos à absurda marca de 4,54 km, ao passo que o início do universo, paradoxalmente, estenderia-se até a marca de 13,5 km nessa mesma régua! E por último, de acordo com a teroria do "Big Rip", nosso universo continuará sua jornada por mais 22 km à frente da nossa marca nessa régua hipotética impressionante!

O que eu quero dizer com tudo isso é que, na maioria das vezes, tudo aquilo que sabemos está baseado em apenas 1 milímetro dessa régua de 35,5 km de extensão e tem gente achando que descobriu a verdade sobre a vida ou o sentido do universo! Religiões, seitas, movimentos e filosofias alegam ter todas as respostas. Pastores, monges, sacerdotes, rabinos, padres e gurus da nova era afirmam conhecer a verdade absoluta, aparentemente sem a devida noção sobre o quão ignorantes nós somos em relação à própria Terra (isso sem falarmos sobre o nosso completo desconhecido universo). Eu mesmo conheço gente que afirma ter a certeza de que descobriu a verdade sobre tudo. Simples assim! Muitos religiosos, inclusive, fazem questão de ignorar abertamente tudo aquilo que ocorreu antes de seus mestres surgirem sobre o mundo, como se tudo que tivesse acontecido antes desses marcos religiosos (vimos que ocorreu um assombroso universo de coisas) não tivesse serventia alguma. Ignorante, absurda e inaceitável presunção!

Se por um lado o vídeo Pálido Ponto Azul (recomendo assistir), mostrado no post de apresentação deste blog, fornece-nos uma boa idéia sobre a paradoxal vastidão do espaço, este post objetiva dar uma boa noção sobre a absurda vastidão do tempo. É só fazer uma simples comparação entre os nossos 6 centímetros de civilização e os 160 metros de pleno dominío dos dinossauros para os leitores entenderem onde eu quero chegar.


Espero que este pequeno exercício possa arranhar o nosso bom senso e fazer de nós pessoas um pouco mais inteligentes e, consequentemente, um pouco mais humildes também.

Abs:

Marcio

quarta-feira, 14 de outubro de 2009

Arautos da Idade Média

No post Brasil Abre As Pernas Para O Vaticano”, eu fiz um comentário sobre a extinção de uma linha mais socialista dentro da Igreja, tal qual foi a Teologia da Libertação nos anos 1970, em detrimento do crescimento da direita, focado muito mais no indivíduo e na família. Falei sobre o crescimento de um movimento ultra-tradicional e mencionei até uma eventual volta do falecido movimento TFP (Tradição, Família e Propriedade). Opa! Falecido movimento? É... Infelizmente, me enganei feio... Esse grupo não só ainda existe como está ganhando cada vez mais força, só que agora utilizando uma outra denominação: Arautos do Evangelho. Ironicamente (seria cômico se não fosse trágico), neste final de semana prolongado, um grande amigo meu foi vítima de uma associação católica de extrema direita que, para a minha surpresa, descobri ser uma dissidência do TFP (pasmém!). Mas vamos ao incidente do meu amigo com o "ressuscitado" grupo fundamentalista cristão:

Meu amigo é casado, sua mulher compartilha do seu ponto de vista "filosófico" e ambos são pais de uma filhinha de 6 anos. Constituem uma família agnóstica que vive de forma pacífica em um condomínio fechado cuja localização será omitida em respeito aos envolvidos. Ao receber no domingo, dia 11 de Outubro, uma ligação dos Arautos do Evangelho dizendo que os membros dessa organização estariam fazendo uma visita à sua casa, levando a imagem da Virgem Maria numa espécie de novena, meu amigo, respeitosamente, agradeceu e disse que não estava interessado. Questionado sobre as razões desse seu desinteresse (até então ele não havia sentido qualquer necessidade de entrar no mérito da questão), meu amigo mencionou que era ateu. Pronto! A partir de então, começou uma série de ligações, insistindo para que meu amigo aceitasse a visita deles, dizendo que tinham aberto uma paróquia dentro do condomínio (pasmém!) e até oferencendo presentes em nome do bispo deles como forma de chantagem. Meu amigo, irritado com tamanha insistência, disse que não gostaria de ser mais importunado e que era para deixarem ele e sua família em paz. Pouco tempo depois, ao sairem em pleno domingo para almoçar e já do lado de fora da casa, preparando-se para entrar no carro da família, um automóvel com 4 homens vestidos à caráter (túnicas de cor marrom e uma cruz estilizada no peito) apareceu na frente da sua casa e os estranhos ocupantes começaram a olhar para ele de forma ameaçadora. Tudo isso dentro de um condomínio fechado, local ecolhido pelo meu amigo justamente para ser um refúgio seguro para sua família!


Meu amigo relatou-me esse absurdo acontecimento hoje e, por pura curiosidade, decidi investigar sobre os Arautos do Evangelho na Internet – e fiquei embasbacado com o que eu descobri! Não se trata de uma pequena associação religiosa sem grande expressão e sim um poderoso grupo católico reconhecido pelo Vaticano e com presença confirmada em 78 países. Os caras são uma bem-sucedida dissidência do TFP, resultado de um racha ocorrido por ocasião da morte do então presidente da organização, Plínio Corrêa de Oliveira. E para quem não faz a mínima idéia do que foi o TFP e acha o teor deste post algo sem a menor importância, vale aqui um pequeno mas importante histórico:

Baluarte do anticomunismo, cultuadora de ícones medievais, propagandista da castidade, a Sociedade Brasileira de Defesa da Tradição, Família e Propriedade, a TFP, foi um dos movimentos mais conservadores e reacionários do Brasil até meados da década de 1990. Com forte envolvimento na política da sociedade brasileira, colaborando inclusive com o regime da ditadura militar, se dependesse da organização direitista o mundo de hoje continuaria chafurdando nos negros pântanos da Idade Média. Desde a morte de seu criador, Plinio Corrêa de Oliveira, a entidade vinha sendo tocada pelos seus oito sócios-fundadores, como mandava o regulamento criado em 1960. Um movimento rebelde, no entanto, anulou o estatuto da TFP, valendo-se de um dispositivo legal segundo o qual uma sociedade civil sem fins lucrativos não pode ser gerida sem consulta a seus integrantes. Em meio a várias idas e vindas jurídicas, os rebeldes convocaram uma assembléia, elegeram uma nova diretoria e, em plena quarta-feira santa, tomaram posse do casarão do bairro paulistano de Higienópolis onde funciona a sede da entidade. Chegaram acompanhados de cinqüenta policiais – e, ao entrar, constataram que vários tapetes e imagens haviam sido levados pelos seus antecessores. Os antigos gestores da TFP perderam o direito não apenas ao teto, mas também à sigla e até ao brasão. O leão rampante sobre fundo vermelho estampado nos estandartes da entidade era referência a um grupo de militantes da Igreja tradicionalista do início do século XX. Impossibilitados de usá-lo, os sócios-fundadores adotaram um leão parecido, só que com cara de bravo e segurando uma espada de fogo – talvez para mostrar que não irão desistir da briga facilmente.

Quem entra no site da associação e da faculdade dos Arautos do Evangelho não deixa de notar com espanto o apelo medieval da sua arquitetura, ornamentos, roupas e adereços. Impressiona também a utilização de coturnos (botas do exército) por debaixo da túnicas, fazendo clara alusão à disciplina militar e utilização de força, caso seja necessário defender aquilo que for considerado como "sagrado" (vale reforçar aqui o comportamento ameaçador na frente da casa do meu amigo). Para quem leu o Código da Vinci, as imagens dos seguidores remete-nos muito às descrições do obscuro personagem de Dan Brown, Silas, integrante da organização cristã conhecida por Opus Dei em sua famosa obra. Enfim, trata-se de um movimento fundamentalista de extrema direita, retrógado e altamente poderoso, o qual ganha cada vez mais espaço na região metropolitana de São Paulo. Com uma grande escola na região da Granja Viana e uma monumental construção conhecida no local como "castelo", a qual devastou 12 mil metros quadrados de mata nativa próximo aos condomínios de alto padrão da Serra da Cantareira, a estratégia de crescimento da organização visa apelar para as classes mais abastadas, já que a própria associação é proprietária de 250 imóveis somente no Brasil.

Fica aqui o meu protesto contra essa abordagem desrespeitosa e entimidadora por parte dos Arautos do Evangelho bem como nossa atenção redobrada para o perigoso crescimento de inúmeras seitas no Brasil, especialmente movimentos já conhecidos e com passado condenável. A expressão "o brasileiro tem memória curta" nunca foi tão atual e pertinente, sendo muito assustador organizações como esta voltarem à tona com a omissão e consentimento da nossa sociedade. A constituição brasileira prega a liberdade de culto mas não menciona nada sobre "liberdade para evangelizar", sendo este segundo item o objeto de crítica mais fundamental deste post. Sendo um país altamente religioso, tendemos a fazer vista grossa para os processos de evangelização, coniventes que somos com a conversão de novos adeptos sob a alegação de que vivemos em um país que goza de liberdade religiosa. E tal argumento é utilizado para justificar a crescente escalada do Cristianismo nas suas mais diferentes formas e pelos mais condenáveis meios, sendo que, por outro lado, a liberdade areligiosa não é mencionada em canto algum. Ateus e agnósticos não estão com seus direitos assegurados pela constituição também?

Embora seja infantil insinuar que a Opus Dei nos moldes da descrição de Dan Brown e os Arautos do Evangelho constituem a mesma coisa, o Código da Vinci não parece ser mais assim algo tão ficcional. Logo, espero que os leitores não sejam abordados por um "Silas" da próxima vez que estiverem saindo para almoçar em um lindo domingo de sol. Se derem esse tremendo azar, não venham dizer depois que foram pegos de surpresa...

Abs:

Marcio

quarta-feira, 7 de outubro de 2009

Anatomia de Um Segredo

Não é a primeira vez que exploro a temática dos paradigmas neste blog mas confesso que é a primeira vez que tenho dificuldades em lidar com o assunto em questão, visto que fui testemunha ocular de uma realidade muito raramente aceita como algo possível, vivenciando na prática a violenta quebra de um paradigma. Conforme foi mencionado nos posts "Evangelização" e "Tudo é Bolha", nossos velhos paradigmas, como sempre, procuram atuar de uma forma castradora, inibindo qualquer explicação fora do contexto padrão. No campo da ciência, por exemplo, os critérios de aceitação daquilo que subentende-se por “experiência real” na cultura do ocidente devem obedecer o mundo objetivo descrito por Descartes e Newton. Qualquer afastamento na descrição dessa “realidade objetiva” é encarado como consequência de uma imaginação fértil ou até mesmo de uma anomalia mental. As vezes, porém, um evento ou elemento novo podem entrar em nossa vida, resultando num verdadeiro “choque de realidades” que faz cair por terra as nossas velhas concepções acerca da realidade. A estória a ser descrita a seguir é verídica porque fui testemunha ocular do evento em questão. Local, data, pessoas, circunstâncias e sequência cronólogica são todos reais. Trata-se da descrição fiel de um evento que realmente aconteceu mas que muitos interpretarão como uma obra de ficção científica, produto de alguém que quer chamar a atenção ou até mesmo o resultado do uso de drogas. Todavia, saliento que o alcance do meu blog em termos de audiência é simplesmente insignificante, nunca fui usuário de drogas, o evento não foi inventado e é um exemplo bastante útil de como a nossa percepção sobre o conceito de “realidade” pode estar “desfocada”.

Em Novembro de 1994, durante um feriado prolongado, eu estava no perímetro externo do Parque Nacional de Itatiaia, que cobre parte da Serra da Mantiqueira no estado do Rio de Janeiro, acampando com um grupo de amigos. Estávamos instalados num local conhecido por Brejo da Lapa. O lugar era maravilhosamente belo: cercado por montanhas, havia um pequeno lago rodeado em parte por um brejo, em parte por terra firme com vegetação rasteira e uma estrada de terra num nível um pouco mais acima, ligando de um lado o longo trajeto até o asfalto e do outro o caminho até o Parque Nacional de Itatiaia, onde fica o magnífico Pico das Agulhas Negras. Era noite e, naquela época, a região bucólica ainda era um refúgio ideal para a prática de acampamentos selvagens, antes do IBAMA proibir tal atividade na área por causa de visitantes inconsequentes que começaram a poluir o local. Éramos um grupo aproximado de vinte pessoas, sentados em forma de meia-lua ao lado do lago. A grande maioria das pessoas estava sentada de costas para a estrada, ouvindo nossa amiga Angélica, no centro, comentar sobre certos exercícios orientais de respiração e relaxamento. Eu estava na outra extremidade da fileira de pessoas, as poucas que podiam contemplar parte da estrada de terra, junto com a minha namorada na época, Márcia, uma amiga chamada Regina e mais um rapaz cujo nome infelizmente eu não lembro.

Estávamos ouvindo a Angélica falar quando algo estranho chamou a minha atenção próximo a um trailer de um amigo nosso, parado na beira da estrada. Eu calculo que estávamos mais ou menos uns 40 metros do trailer, quando uma luz muito tênue mas visível o suficiente para chamar a minha atenção começou a aparecer. Era incrível… Por detrás do trailer surgiu uma figura humanóide irradiando luz do próprio corpo que começou a caminhar pela estrada. Eu não podia acreditar no que estava acontecendo. Tentei localizar qualquer foco de luz que pudesse denunciar uma brincadeira por parte de alguém munido de um “projetor” mas não vi absolutamente nada. Não havia ninguém na estrada além daquela estranha figura. O que era aquilo? A despeito da peplexidade da visão tive uma inesperada reação de ficar simplesmente quieto. Tinha a sensação, não sei porque, de que poderia perder o espetáculo caso fizesse qualquer estardalhaço. Só tive um impulso de cutucar a Márcia e perguntar em voz baixa se ela estava vendo a mesma coisa que eu, sendo uma forma também de conferir se eu não estava ficando louco. Para meu alívio, ela confirmou que estava vendo tudo também. Permanecemos quietos, atentos e de olhos bem abertos. Tratava-se da silhueta de uma figura humana esguia em forma de luz branca, concentrada, dando para perceber nitidamente a cabeça, o tronco, braços e pernas. Não era possível perceber detalhes tais como fisionomia, roupa, etc. Era como se a criatura fosse um holograma em movimento que emanava luz do próprio corpo, sem qualquer foco de luz visível fora dos contornos de seus membros. Uma luz contida nos perímetros de um formato humanóide, andando pela estrada de terra, sendo visivelmente mais alto que um ser humano comum (depois de terminada a estranha manifestação, calculamos que a figura deveria ter uns 2,5 metros de altura aproximadamente, tendo como referência de comparação a altura do trailer).

Alguns segundos depois de efetuar sua caminhada, a criatura parou e voltou-se para nós, como se estivesse olhando em nossa direção, como se soubesse que estávamos vigiando seus passos. Senti um arrepio correr pela espinha mas fiquei estranhamento calmo logo em seguida. Fiquei muito contente por estar observando algo tão inusitado mas era uma alegria serena, contida. Tive uma estranha sensação de tranquilidade e a criatura começou a caminhar novamente. Um pouco mais para a frente, a luz começou a desvanecer-se, perdendo a sua nitidez original, semelhante a um canal de TV fora do ar e cheio de “chuviscos”, até desaparecer por completo diante dos nossos olhos atônitos. Chequei com a Márcia, com a Regina e com o rapaz ao meu lado após o final da explanação da Angélica e eles confirmaram tudo aquilo que eu tinha acabado de ver. Fiquei muito feliz mas ao mesmo tempo perplexo. Havíamos visto algo totalmente fora dos padrões de qualquer explicação natural ou científica e ninguém acreditaria em nossa estória. Vale ressaltar que não havíamos bebido nada, nunca fomos usuários de drogas e sempre enxergamos muito bem. Mas a partir de agora, se estivéssemos dispostos a dividir tal experiência com outras pessoas, deveríamos estar preparados para a ridicularização do nosso testemunho.

Embora estivesse certo do que acabara de ver eu ainda não estava satisfeito. Eu queria livrar-me de qualquer possibilidade de engano ou mal-entendido. Foi quando pedi para a Márcia, a Regina e o rapaz ao meu lado permanecerem ali, no local da observação, pois eu gostaria de dirigir-me até a estrada para ver de perto por onde tal forma luminosa acabara de passar. O intuito era fazer o mesmo trajeto do humanóide para saber se não poderíamos ter confundido tal manifestação com algum fenômeno conhecido, tal qual a possibilidade de alguém estar andando por lá com uma lanterna acesa, por exemplo. Eu sabia que era plenamente capaz de diferenciar o estranho fenômeno de uma pessoa andando por ali com uma lanterna, afinal, já tinha visto pessoas passando por ali várias vezes durante a noite. Mas mesmo assim, insisti por pura precaução. Fiz o trajeto várias vezes, hora munido de lanterna acesa, hora apagada; com a lanterna acesa dentro do meu casaco e fora dele; andando depressa e andando devagar… Enfim, esgotei todas as formas pelas quais alguém andando por ali pudesse causar algum “efeito visual” fora do normal. Voltei depois para o encontro da Márcia, da Regina e do rapaz e pedi para que me relatassem o que tinham visto. Os três comentaram que em nenhum momento eu sequer havia me aproximado daquilo que havíamos presenciado. Para começar, a Márcia disse que eu aparentava ter quase a metade da estatura do indivíduo em formato de luz. E as peripécias com a lanterna e o casaco tampouco chegaram perto do efeito extraordinário que havíamos visto anteriormente. Senti um grande alívio novamente, afinal, havia confirmado a minha impressão inicial. Por mais que a maioria das pessoas ali presentes não tivesse visto o humanóide luminoso, por uma simples condição de posicionamento físico perante tal acontecimento, estávamos certos de que tínhamos confrontado nossas observações e de que não podíamos negar o que vimos. No dia seguinte ficamos sabendo que um grupo de pessoas acampadas numa barraca morro acima, um pouco mais distantes do que nós, haviam notado o estranho fenômeno também. Era mais uma confirmação de que não havíamos sido presas de um engôdo ou de um mal-entendido. Tínhamos apenas sido testemunhas oculares de uma realidade fantástica.

Carrego as lembranças deste acontecimento comigo por onde quer que eu vá. As vezes minha realidade diária choca-se de frente com as lembranças deste evento e procura-se impor, tentando convencer-me de que não vimos o que vimos ou de que tudo não passou de um sonho. Talvez se eu não tivesse eliminado na hora certos detalhes passíveis de questionamento hoje fosse um pouco mais fácil convencer-me de que fora um engano. Mas a realidade dos fatos não permite negar o que vimos. Interpretações para tal evento podem variar tanto quanto variam os nossos paradigmas, dando conotações esotéricas, espiritualistas ou religiosas para uma coisa não se enquadra na explicação culturalmente aceita. Pela minha perspectiva, porém, fiquei com a impressão de que tratava-se do subproduto de uma avançada tecnologia holográfica. E de onde tal tecnologia teria vindo os seguidores deste blog já devem estar montando a imagem em suas cabeças. Todavia, antes que os céticos se manifestem a respeito (eu mesmo sou um deles), vale lembrar que somente hoje, 15 anos depois do ocorrido, as primeiras experiências com hologramas nos moldes de "Star Wars" estão sendo efetuadas com sofisticados aparatos tecnológicos, elementos que não exisitiam na época, muito menos ainda em uma estrada de terra sem luz no meio do mato e a qual eu mesmo chequei em seguida com o intuito de encontrar qualquer forma de embuste (e não encontrei nada!).

Mas o que importa, no momento, é a dinâmica subjacente que faz tal manifestação ser apenas um dos exemplos do nosso comportamento diário de distanciamento e indiferença perante as coisas que não vemos, não sentimos ou não percebemos. Se certas pessoas vivem situações perante as quais a ciência oficial não consegue dar nenhuma explicação ou se eventos “oficialmente aceitos” ocorrem no país vizinho ou do outro lado do planeta isso não parece ser algo real. Como a estória de São Tomé retratada logo acima, só acreditamos naquilo que podemos tocar, colocando-nos arrogantemente como referência para aquilo que acontece ou deixa de acontecer sobre o mundo. E com a licenca de René Descartes, a equação para a arrogância é bastante simples: “não vejo, logo não existe”. Obviamente, nosso cotidiano implacável já encarrega-se de preencher o nosso tempo com problemas suficientemente grandes ao ponto de ficarmos preocupados apenas com aquilo que possui relação direta com a nossa vida. Por isso, não é preciso ser muito inteligente para entender porque tal evento virou um segredo praticamente intocável em minha lembrança. Com exceção de talvez meia-dúzia de pessoas, ninguém mais tem a mínima idéia do ocorrido. E não é para menos.

Por que estou abrindo o jogo agora? Não sei... talvez uma incapacidade em lidar com o insólito em um mundo cada vez mais padronizado culturalmente pelo continuismo da tradição em suas mais variadas formas. Está na hora de quebrarmos alguns paradigmas...

Abs:

Marcio